Transações de compra e venda de imóveis têm sido muito utilizadas para lavar dinheiro, um crime que prejudica a sociedade e o país. Usar o mercado imobiliário na lavagem de dinheiro sujo é um problema mundial, e não só do Brasil. E são algumas características específicas desse tipo de comércio que o torna tão suscetível a ser envolvido nesse crime.
Para se ter uma ideia, aproximadamente 30% dos ativos recuperados pelo crime organizado internacional são provenientes de propriedades imobiliárias, segundo estimativa do Gafi (Grupo de Ação Financeira Internacional), publicada pelo Instituto de Prevenção e Combate à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo (IPLD).
Se você acompanha nossas postagens, já sabe que a lavagem de dinheiro nada mais é do que um processo através do qual um dinheiro proveniente de atividades ilegais, como tráfico de drogas, de armas e de pessoas, corrupção, assaltos e roubos etc., percorre um longo caminho – muitas vezes cheio de meandros e envolvendo mais do que um país. E o objetivo central é tentar esconder a origem ilícita do capital até ser recolocado no mercado como um dinheiro aparentemente legal. Em outras palavras, é dar aparência de limpo a um dinheiro sujo.
E onde entra o mercado imobiliário? Em geral, na integração do dinheiro na economia do país. Por exemplo, alguém compra uma propriedade por, digamos, R$ 500 mil declarados na escritura, mas na verdade o comprador dá para o vendedor mais R$ 100 mil “por fora”, ou seja, com dinheiro vivo. Mais tarde, essa pessoa pode revender o imóvel por R$ 600 mil, completando a lavagem do dinheiro. Podendo até esse montante ser, depois, investido em novas atividades ilegais.
Como citado anteriormente, o mercado imobiliário tem algumas características que o torna atrativo para a lavagem de dinheiro. Algumas delas são:
Além dessas características do setor imobiliário, outros fatores o levam a ser mais suscetível à lavagem de dinheiro. Reportagem do G1, por exemplo, aponta falhas nas informações suspeitas. É que as empresas envolvidas nas negociações imobiliárias devem produzir relatórios para serem enviados ao Coaf (Conselho de Controle de Atividade Financeira), do governo, mas frequentemente são inadequados ou incompletos.
Outro fator é a permissão aos chamados “contratos de gaveta” (venda direta entre vendedor e comprador), apesar de o registro de compra e venda de imóveis ser público. Além disso, os valores dos imóveis são subjetivos, o que inclusive dificulta uma possível investigação.
Fato é que o segmento imobiliário é obrigado pela Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro (Lei nº 9.613/98) a cumprir uma série de normas e procedimentos, especialmente quanto à coleta de informações e à comunicação de atividades suspeitas ao órgão regulador. É preciso cuidados e ética para combater esse tipo de criminalidade.
A 1Malaysia Development Berhad (1MDB), empresa governamental de desenvolvimento estratégico, foi criada em 2009 pelo então primeiro-ministro da Malásia, Najib Razak. Apregoando a missão de promover o desenvolvimento econômico, através de parcerias globais e investimento direto estrangeiro, em poucos anos esse fundo se transformou num dos maiores casos de fraude financeira do mundo. E envolveu lavagem de dinheiro no setor imobiliário, apesar de não só nele.
As investigações apontaram que bilhões de dólares foram desviados da empresa estatal, envolvendo altos funcionários do governo, bancos internacionais e até mesmo celebridades. “O dinheiro encheu os bolsos de alguns indivíduos poderosos e foi usado para comprar imóveis de luxo, obras de Van Gogh e Monet, um jato particular e até financiar um filme blockbuster de Hollywood [o filme O Lobo de Wall Street]”, escreveu a Época Negócios.
As investigações começaram em 2015, depois que o The Wall Street Journal informou que quase US$ 700 milhões da 1MDB haviam sido desviados para a conta pessoal de Razak. No ano seguinte, o Departamento de Justiça dos EUA entrou com ações civis para apreender bens comprados com dinheiro roubado do 1MDB. Em 2016, Razak foi preso e cumpre pena de 12 anos depois de ser considerado culpado de corrupção e lavagem de dinheiro.
Outras pessoas foram condenadas. Entre elas, está o ex-banqueiro do banco Goldman Sachs, Roger Ng, que atuava na Malásia. Em março de 2023, Ng foi condenado nos EUA a dez anos de prisão. Há alguns investigados que continuam foragidos.